quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

DEVANEIOS - DE VITALINA, DE CARITÓ

Tenho Cara De Antigamente, Quando As Casas Tinham Caritós, Preteleiras do Esquecimento
BOTA PÓ VITALINA, SE NÃO CASOU ATÉ OS TRINTA NÃO SAI MAIS DO CARITÓ
Reclame de Remédio De Antigamente

Vitalina, mulher com vitalidade!  Errou.  Mulher velha que nunca casou, que aos trinta, solteira, dizia-se que dera três tiros na macaca.  Sina ingrata para mulheres que não interessavam aos homens, que eram zombeteadas, objeto de mangação.  Se empoavam exageradamente ficando com uma cara branca destoante do resto de sua cor nativa.  Tacavam um sinal de lapis preto fatal no meio da brancura do pó.  

Caritó era uma prateleira no alto de uma parede alta, comum em casas de antigamente, onde literalmente eram jogadas coisas pequenas que lá ficavam quase sempre esquecidas.  
 Dizia-se dessas vitalinas invisíveis nos caritós da vida.  Drama comum nas cidades provincianas onde seus homens emigravam para as cidades grandes à procura de um futuro e nunca mais voltavam.  Essa fruta no interior era peça rara e as filhas mais velhas, o seguro do envelhecimento das mães enfeiecidas antes do tempo.  O futuro dessas meninas, jã aos sete anos, indiciada a cumprir pena de virgens profissionais brutalizando o pendor da Natureza.  A faceirice feminina nessa comunidade interiorana era deteriorada e estrupada em plena infância.  Se tornavam beatas ridículas à procura de uma fé  que lhes acalentasse os furores animais.  Ficavam azedas querendo ser doces, horrendas querendo ser femininas, se apresentando pelo avesso sem nem estar pensando nisso.

Deus, oh Deus!  Porque essa bichinhas foram assim tratadas, porque aos sete anos tinham que andar com um irmãozinho escanchado no quadril, como se mãe dele fosse?  Porque quando em crianças, em suas "dormingueiras", com seus vestidos de chita, laço azul no cocoruto de um mimoso chapeuzinho, alparcata só usada uma vez por semana para esconder um pèsito já com as marcas das estradas de pedra, feiurinhas andantes?  Bom, meu Deus, eu não sei, na minha ignorância, mas Tu sabes!  

Deus eterno, perdoa-me a insânia de querer entender o mistério que vem de Ti, metendo-me incautamente num terreno Teu!  É que me dá dó, mesmo agora, passados tantos anos destas coisas, eu já um senhor de barbas brancas, remoendo memórias de tristezas.  Tenho histórias com raizes nesses enredos, na minha família, nos idos de quarenta, que aportaram aqui em Recife em nossa casa,   sobrinhas de minha mãe, perseguindo o caritó e  por pretextos outros e entre eles, esvaziar-se do peso de um cabaço, honra obrigatória de qualquer moça nordestina.  De Alagoa Grande-PB, terra de Jakson do Paandeiro, veio uma que  parou em Recife, foi a Salvador e de lá veio casada com um grego escroque que foi depois encontrado em um banco de praça de caruru, quebrado por uma surra dada por alguém a quem resolvera aplicar seu estelioanato. Hoje é uma senhora na senectude, na sua origem, com um filho senior grego-brasileiro.  A outra veio da terra dos Guarás, Guarabira-PB, ficou conosco por longo tempo e retornou à sua casa contraindo matrimônio após os cinquenta anos de idade.

Tristes memórias de costumes que tantas dores causaram tão profundamente em almas humanas.



   

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