domingo, 20 de outubro de 2013
DEVANEIOS - DE HISTÓRIA DE UM CÃO
DE LUIZ GUIMARAES
Eu tive um cão. Chamava-se Veludo,
Magro, asqueroso, revoltante, imundo,
Para dizer numa palavra tudo,
Foi o mais feio cão que eu vi no no mundo
Recebi-o das mãos de um camarada,
na hora da partida. O cão gemendo
na hora da partida. O cão gemendo
não me queria acompanhar por nada
enfim -- mal grado seu -- o vim trazendo
enfim -- mal grado seu -- o vim trazendo
Menino E Mãe Judeus Agredindo Palestina
Domingo, 20 de outubro de 2013
O GALO BOM SE CONHECE PELO TAMANHO DA CRISTA
Meu amigo cabisbaixo, mudo
Olhava-o...<o sol nas ondas se abismava>
<Adeus -- me disse -- e ao afagar Veludo,
Nos olhos seus o pranto borbulhava.
Trata-o bem. verás que o rafeiro
Te indicara os mais sutis perigos!
Adeus! e que este amigo verdadeiro
Te console no mundo ermo de amigos.>
Veludo à custo, habituou-se a vida.
Sua rugosa pálpebra sentida
Que o destino de novo lhe acolhera!
Chorava o amigo que perdera.
Nas longas noites de luar brilhante
Febril, convulso, trêmulo, agitando
A sua cauda -- caminhava errante
A luz da lua -- tristemente uivando.
Tussenel Figuier e a luta imensa
Dos modernos zoologicos doutores
Dizem que o cão e um animal que pensa!
Talvez tenham razão esses senhores.
Lembro-me ainda trouxe-me o correio
Cinco meses depois do meu amigo
Um envelope fartamente cheio!
Era uma carta. Carta! Era um artigo.
Contendo a narração miuda e exata
da travessia. Dava-me importantes
notícias do Brasil e de La Prata.
Falava em rios, árvores gigantes.
Gabava o steamer que levou! Dizia
que ia tentar inumeras empresas!
Contava-me tambem que a bordo havia
toda a sorte de risos e belezas.
Finalmente , por baixo disso tudo
em nota bem do melhor cursivo
recomendava o pobre cão Veludo.
Pedindo-me que o coservasse vivo.
Enquanto eu lia, o cão tranquilo e atento
mcontemplou e -- crêia que é verdade.
Vi comovido, vi neste momento
seus olhos gotejaram de saudade.
Depois lambeu-me as mãos humildemente,
estendeu-se aos meus p;es atencioso,
movendo a cauda -- e adormeceu contente,
farto de um puro e satisfeito gozo.
Passou-se o tempo. Finalmente um dia.
vi-me livre daquele companheiro..
Para nada, Veludo me servia.
Dei-o a mulher de um velho carvoeiro
e respondi. Graças a Deus já posso,
dizia eu, <viver neste bom mundo
sem ter que dar diariamente um osso
a um bicho vil.\, a um fêio cão imundo.>
Gosto dos animais, porém prefiro
a essa raça baixa e aduladora,
un alazão inglês, de sela ou tiro,
Ou uma gata branca cismadora.
Mal respirei por\ém, quando dormia,
e a negra noite amortalhava tudo
senti, que à minha porta alguém batia!
Fui ver que era. Abri, Era Veludo.
Saltou-me as mãos, lambeu-me os pés ganindo.
Farejou toda a casa satisfeito!
E -- de cansado -- foi rolar dormindo,
como uma pedra junto do meu leito
Praguejei furisco, era execrável
suportar esse hóspede importuno
que me seguia como miserável
ladrão, ou como um pérfido gatuno.
E resolvi-me enfim! Certo é custoso
dizê-lo em alta voz e confessá-lo,
para livrar-me desse cão leproso
havia um meio só! Era matá-lo.
Zunia a asa funebre dos ventos!
Ao longe o mar na solidão gemendo
arrebentava em uivos e lamentos...
De instante a instante o tufão crescendo.
Chamei Veludo! Ele seguiu-me. Entanto
a fremente borrasca me arrancava
dos frios ombros o revolto manto,
E a chuva meus cabelos fustigava.
Despertei um barqueiro. Contra o vento,
contra as ondas coléricas vagamos!
Dava-me força o torpe pensamento!
Peguei um remo e com furor remamos.
Veludo à proa olhava-me choroso
como o cordeiro no final momento.
Embora era fatal! Era forçoso
livrar-me enfim desse animal nojento.
No largo mar ergui-o nos meus braços
e arremessei-o às ondas de repente...
Ele moveu gemendo, os membros lassos
lutando contra a morte! Era pungente!
Voltei a terra -- entrei em casa. O vento
zunia sempre na amplidão profundo.
pra ver-me ouvir o atroz lamento
de Veludo nas ondas moribundo.
Mas ao despir dos ombros meus o manto,
notei -- oh grande dor! haver perdido
uma relíquia que eu prezava tanto!
Era um cordão de prata! Eu tinha-o unido
contra meu coraçao constantemente,
e o conservava no maior recato,
pois minha mae me dera essa corrente
e, suspensa à corrente, o seu retrato.
Certo caira alem do mar profundo
no eterno abismo que devora tudo!
E foi o cão. Foi esse cao imundo
a causa do meu mal! Ah, se Veludo
duas vidas tivera -- duas vidas
eu arrancaria àquela besta morta
naquelas vis entranhas corrompidas!
Nisto senti uivar à minha porta.
Corri, abri...Era Veludo! Arfava!
Estendeu-se aos meus pés -- e docemente
deixou cair da boca que espumava,
a medalha suspensa da corrente.
Fora incrível, oh Deus! -- Ajoelhado
junto ao cão -- estupefato absorto,
palpei-lhe o corpo, estava enregelado,
sacudi-o, chamei-o! Estava morto.
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