sábado, 8 de abril de 2017

DEVANEIOS - DE "A NOIVA DO TEMPO ( 080415/16)

A PEDRA DA APERTADA  HORA - URUBURETAMA-CE-DE ALTAIR ANDRADE CRUZ

(Se tiverem dificuldade em ler o texto abaixo, cliquem 2 vezes no fim de cada parágrafo)

A Rosinha Contou Pra Taíca E A Taíca Contou Pra mim
E QUEM CONTA UM CONTO AUMENTA UM PONTO

Sabe por que a gente manga das moças enfeitadas demais? É porque lá na serra de Uruburetama entre vales,  num lugar chamado Apertado da Hora tinha uma casinha bem picxototinha de taipa onde morava Raimunda. Os de casa chamavam ela de Mundinha. Os cabelos de Mundinha eram bem compridos e louros como os "caroço" do milho. Seu semblante era doce e suave igual como o aluá pras festa e feito os bolinho pé-de-moleque com cravo e canela. Ela  tinha na cara muita espinha carnal também apelidada de  carnegão. Isso tirava toda a lindeza da cara dela e nem deixava ser bonito o verde dos seus olhos, fundos como as águas do rio Mundaú. Quando o dia raiava, todas as madrugadinhas, o seu pai, a sua mãe e os seus doze irmãos grandes e pequenos saiam para os roçados e Mundinha ficava sozinha em casa cozinhando o feijão na panela de barro, para comerem de noite. Quando o feijão cheirava dizendo que tava pronto, ela puxava a lenha e deixava só as cinzas dormindo, para economizar. Depois ia para a janelinha a tarde toda e ficava escutando o zum-zum-zum dos maribondos. Olhava as nuvens branquinhas como capuchos de algodão, olhava o caminhozinho rente à cerca, e, um dia imaginou que nele, no caminho, chegava um rapaz muito bonito. Imaginou uma roupa para ele – de soldado como a lá do cabo do povoado, uma roupa de soldado de São Jorge da lua, pra ele, porque não queria que o moço fosse um matuto vaqueiro ou "pissuidor" só de um roçado. E imaginou a cara dele morena do sol, limpinha, de cabelo louro debaixo do "bonel" de militar, de olhos verdes e grandes como o rio Mundaú. Uma cara parecida com a dela mesma, mas, diferente. Foi uma tarde que Mundinha nunca mais esqueceu. De noitinha chegaram seu pai, sua mãe e seus doze irmãos grandes e pequenos e comeram o feijão. Estava muito bom.

E Mundinha todas as manhãs ficava cozinhando o feijão, puxava a lenha grande e deixava só as cinzas dormindo, para economizar, depois, penteava os longos cabelos e os enfeitava com uma flor chanana e ia para o meio do terreiro e ficava em pé esperando pisar em cima da própria sombra. Era  meio dia em ponto, igual com a cantiga do galo “essa é a hoooora” e o "rincho" “aeiouuuuuu- uuuuuu”  do jumento, (também chamado jegue, jerico, asno). E todos ‘os meio do dia’ o soldado de São Jorge da lua chegava para conversar com ela até de noitinha. Com o tempo o povo começou a chamar Mundinha de “A Noiva do Tempo”.

(JOSÉ MAURO DE VASCONCELOS)
(...) Sentei perto do meu irmãozinho e falei com calma.
- ‘Péra’ aí que eu vou pensar um brinquedo.
Mas, logo a fada da inocência passou voando numa nuvem branca que agitou as folhas das árvores, os capinzais do valão e as folhas de Xururuca. Um sorriso iluminou meu rosto maltratado.
- Foi você quem fez isso, Minguinho?
- Eu, não.
- Ah que beleza, então é o tempo do vento que está chegando.
Na nossa rua havia tempo de tudo. Tempo de bola de gude. Tempo de pião. Tempo de colecionar figurinhas de artistas de cinema. Tempo de papagaio, o mais bonito de todos os tempos. Os céus ficavam por todos os lados repletos de papagaios de todas as cores. Papagaios lindos de todos os feitios. Era a guerra no ar. As cabeçadas, as lutas, as laçadas e os cortes.

As giletes cortavam as linhas e lá vinha um papagaio rodopiando no espaço embaraçando a linha do cabresto com a cauda sem equilíbrio; era lindo tudo aquilo. O mundo se tornava só das crianças da rua. De todas as ruas de Bangu. (...)






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