Tenho Cara De Antigamente, Quando Palestinos Eram barbaramente Enganados Pelos Ingleses
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Israel e as fronteiras pré-1967: uma proposta importante, mas infrutífera, por Henrique Fialho Barbosa
O discurso do presidente americano Barack Obama no dia 19 de maio foi a sua primeira grande declaração sobre o Oriente Médio desde o famoso discurso, entitulado “A New Beginning”, pronunciado no Cairo em 2009, no qual ele afirmou seu compromisso de iniciar um novo relacionamento com as populações árabes e muçulmanas, desgastadas por vários aspectos da guerra contra o terrorismo iniciada em 2001.
A mesma cidade do Cairo foi palco para a maior e mais espetacular das revoluções da Primavera Árabe, e o mesmo presidente Obama foi criticado por não ter sido suficientemente incisivo em apoiar o movimento que conseguiu, finalmente e apesar das grandes diferenças existentes nas causas e consequências de cada uma das revoluções, libertar uma parte do Oriente Médio do jugo de ditadores que já acumulavam décadas à frente de governos arbitrários e autocráticos.
No contexto atual, obviamente, não há lugar para dúvidas – a Primavera obteve, e continua obtendo, sucesso impressionante por onde passou e está passando. O discurso de Obama em Washington foi, em boa parte, uma reafirmação de que os Estados Unidos estão ao lado dos movimentos de libertação no Oriente Médio, estipulando três princípios básicos para a resposta americana a eles: A oposição ao uso de violência e repressão contra populações; a existência de um conjunto de direitos fundamentais; o apoio a reformas políticas no Oriente Médio e Norte da África que sejam de acordo com as expectativas das pessoas comuns da região.
Nada disso, porém, foi objeto de polêmica, afinal, não se esperaria uma declaração do presidente dos Estados Unidos sobre esse assunto que não seguisse essas linhas. A controvérsia foi resultado da parte final do seu discurso, no qual ele declara sem ambiguidades – após o já mencionado panegírico aos movimentos que visam libertar populações do jugo opressor – o seu apoio a um acordo de paz entre Israelenses e Palestinos que encontre, em linhas gerais, as “fronteiras” pré-1967, com pequenas diferenças consistindo de trocas de território que sejam mutuamente acordadas.
A reação do primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu foi praticamente imediata, reconhecendo as fronteiras de 1967 como “indefensáveis” e afirmando esperar uma reafirmação dos compromissos assumidos pelos Estados Unidos em 2004 sobre estas mesmas fronteiras, quando uma carta do presidente Bush afirmou que é “não-realista” pensar num retorno às linhas de armistício de 1949. Para entender o que significa voltar às “fronteiras” de 1967 é preciso relembrar dois acontecimentos fundamentais na história de Israel: a “guerra de independência” (nome israelense) de 1948-49 e a Guerra dos Seis Dias, de 1967.
A guerra “de independência” (chamada pelos palestinos de An-Nakba – “desastre”) de 1948-9 culminou com a assinatura dos acordos de armistício de Israel com o Egito, a Síria, o Líbano e a Transjordânia e a demarcação de linhas provisórias de armistício, as green lines, que não foram consideradas como fronteiras definitivas (exceto a fronteira com o Líbano) justamente por conta de ainda não estar resolvida a questão palestina. São essas linhas, então, que são mencionadas quando se fala em reverter aos limites pré-1967.
Essa questão das fronteiras foi então definitivamente resolvida em 1967, com o advento da Guerra dos Seis Dias, que foi um dos eventos mais importantes da história de Israel. Nessa guerra, Israel não só triplicou seu território, incorporando as Colinas de Golã, a Cisjordânia, a Faixa de Gaza e a Península do Sinai – com fronteiras definitivas – como demonstrou para os inimigos da região o seu enorme potencial militar e estratégico, ganhando um peso muito maior na balança de poder regional.
Nem a sugestão do presidente Obama como a repulsa do primeiro-ministro Netanyahu são novas, pois algumas outras vezes se sugeriu voltar às fronteiras pré-1967, já que a famosa resolução número 242 do Conselho de Segurança aponta nesse sentido, e a resposta israelense foi sempre enfática: o ex-Primeiro Ministro Menachem Begin (1977-1983) descreveu a ideia como “suicídio nacional para Israel”, a ex-Primeiro Ministro Golda Meir (1969-1974) comparou aceitar tal ideia ao crime de lesa-pátria, mas a declaração mais famosa vem do ex-Ministro das Relações Exteriores Abba Eban (1966-1974), que disse que tais fronteiras são uma “memória de Auschwitz”.
As razões históricas para tanta preocupação não são realmente negligenciáveis. Caso as fronteiras sejam conformadas às linhas pré-1967, o estado de Israel ficará perigosamente estreito em certos pontos, sendo mais fácil para, numa ofensiva árabe, dividir o país e atacá-lo em dois fronts. Isso fica particularmente preocupante quando se pensa que, apesar de tudo, o estatuto do Hamas, que recentemente deu passos largos no sentido de uma reconciliação com o Fatah, ainda prevê a destruição do estado de Israel como um objetivo principal. Ainda que o território sob governo parcial da Autoridade Palestina hoje seja bastante similar ao que seria caso se acordasse as fronteiras no modelo pré-1967, são situações bem distintas ter um governo palestino nos moldes de hoje, altamente constrangido pelo governo israelense, através de muros, checkpoints e diversos outras estratégias, e ter um governo palestino completamente funcional, com instituições independentes, exército e autonomia de estratégias de defesa e de fronteira e seguindo a própria lógica. Isso sem mencionar a divisão da cidade de Jerusalém, uma questão tão importante quanto um anátema para ambos os lados.
Possivelmente a mensagem principal que o presidente Obama pretendeu passar com essa nova proposta política diz respeito ao segundo problema, na ótica de Israel, na aceitação dessas fronteiras: a muito delicada questão dos assentamentos judeus em território palestino. Existem hoje muitos assentamentos e colonos judeus em território, inclusive privado, palestino, e a retração às fronteiras pré-1967 significaria incorporar de jure a maioria desses assentamentos ao território palestino. Ainda que a declaração tenha mencionado a possibilidade de “trocas mútuas de território” como uma forma de apaziguar a previsível ira de Israel e da AIPAC (American-Israel Public Affairs Committee, o poderoso lobby pró-israel nos Estados Unidos), o problema da falta de cooperação do governo israelense em terminar definitivamente a construção de novos assentamentos e diminuir os já existentes é o principal problema hoje no caminho das negociações de paz entre Israel e Palestina, causando inclusive a retirada desses últimos das negociações por algum tempo em 2010.
A questão dos assentamentos também foi um grande constrangimento nas relações Israel-EUA em 2010, depois que um plano com 1.600 novos assentamentos em Jerusalém Oriental foi publicado precisamente enquanto o vice-presidente dos Estados Unidos Joe Biden estava em visita oficial a Israel. Fica então claro que é do interesse de Obama colocar um limite na má-vontade governamental israelense em cooperar no assunto.
A escolha da menção explícita aos limites pré-1967, porém, é muito delicada, pois, ainda que apoiada pela maioria dos governos europeus e do G8, ela arrisca colocar Israel e os israelenses ainda mais na defensiva, num contexto que é perigoso por três motivos principais: primeiro, a já mencionada aliança do Fatah com o Hamas já é um motivo de preocupação para o governo de Netanyahu. Segundo, por conta da resignação do enviado especial de Obama ao processo de paz no Oriente Médio, George Mitchell. Ainda que a justificativa oficial tenha sido “motivos pessoais”, é conhecida a frustração de Mitchell em tentar avançar negociações num contexto de não-comprometimento, principalmente por parte de Israel. Terceiro, a aproximação das eleições presidenciais nos EUA tornam impossível qualquer tipo de ação severa de Obama em relação a Israel, tanto nas relações bilaterais como em fóruns multilaterais.
Por isso, ainda que a proposta de Obama tenha sido fruto de uma intenção política legítima em avançar o processo de paz entre Israel e Palestina na tentativa de estabelecer um marco-base para as negociações, tanto a escolha da marca quanto a conjuntura política atual tornam difícil que qualquer progresso palpável seja concretizado, pelo menos no curto e médio prazo, através dessa proposta.
Henrique Fialho Barbosa, aluno de graduação em Relações Internacionais na Universidade de Brasília e participante do Laboratório de Análise em Relações Internacionais do Programa de Educação Tutorial – PET/SESU/MEC – de Relações Internacionais da Universidade de Brasília.
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Veja, não sou de nenhuma patrulha ideológica, mas achei importante escrever isso.
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