quarta-feira, 18 de novembro de 2015

O TAMANHO DO PECADO



Memórias de infância e interpretações doentias de pecado.  Comportamento próprio entre minorias, seja do que for.  1947.  Eramos os crentes.  Tinha eu doze anos.  Íamos a família, seis pessoas, do arrabalde da Torre, em Recife, para cidade de Olinda onde meu pai era pastor na Igreja Batista.  Seis famílias acolhiam cada um de nós até o retorno à noite.  Eu ficava no Varadouro na casa de uma senhora bastante idosa, onde tinha um menino bastante pequeno e à tarde sem nada o que fazer começavam os demoniozinhos as suas tentações.

Eu saia e na praça Duarte Coelho tinha um cinema, antro do pecado para nós.  Eu lutava para não ceder e ir para o inferno.  Comprava um, não dois, embrulhozinhos de "bidubin", um torrado e outro cozinhado, e enfrentava aforça do mal. Meninos da minha idade e até menores ficavam em pé na frente da primeira bancada em baixo do telão.  Era uma gritalhada, entulho de papeis e cascas dos amendoins no chão,  Cheiro forte e zumbido mais forte ainda.  Todos de cabeças erguidas para ver a imagem destorcida e nem interessava o bang-bang do bandido, do xerife, do mocinho...

Eita pecadão.Á noite no culto, primeira semana do mês, a comunhão.  Eu já pertencia à membresia e até hoje não reconheço a responsabilidade.  Ficava inquieto mas sabia que  não estando em condição moral com o meu Deus mediante tão grande pecado de ter entrado em tão pecaminoso lugar, não poderia comungar.  Meu pai ria saber se não me escafedesse.  Que sofrimento.  Saia e me escondia num lugar fora do templo e cometia neste dia meu segundo pecado,  Pai do Céu!  E o fogo do inferno doía muito?  Aflição, dor na consciência, medo da perdição.  

Não sei o resultado desses conflitos em que prejuízos ou benefícios me valeriam.  O reconhecimento da infração contra o Criador era bom sinal;  a escapada sutil e covarde era indiciadora e fatal.  E nesse balanceio o que sobraria para formação do meu conceito de homem do bem?  Uma infelicidade só, um desnorteio, uma pequeneza de caráter.  Choramingava à sós, temia o satanás, mais do que ao Deus.  Não era bom na bola de gude, no papagáio, pior ainda;  Jogava com minha bola furada, certamente porque ela era minha.  Bom, ia pegar guaiamum com umas ratoeiras que fazia.  Pronto.
  


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